terça-feira, outubro 25, 2005

História do homem cujos membros resolveram deixar de dar de comer ao estômago

Como já toda a gente deve ter reparado, a justiça entrou em greve, incluindo os mais diversos funcionários do sistema judicial e os próprios juízes. Das razões invocadas para esta parlisia quase total, sei apenas alguns pontos que têm sido impressos nos jornais. É pena que as disputas cheguem a este ponto, porque a justiça já goza de tão pouca confiança junto dos cidadãos que, independentemente de quem tem razão no diferendo, custa-me a admitir outra percepção que não seja a da degradação dessa imagem. Em relação aos funcionários, não tenho nada a comentar. Já em relação aos juízes, que eles não consigam ver isso, só mostra o quão desfasados se permitiram ficar em relação ao sentimento dos cidadãos, por outras palavras, os utentes da justiça. No entanto, se só fosse uma questão de direitos e deveres laborais, também não teria muito a comentar.
O que me causa uma perplexidade enorme é como é que é possível entrarem em greve os titulares dos mais altos cargos dum dos orgãos de soberania da Nação, os tribunais. Então, um dos braços do poder político tripartido, representado pelos seus altos magistrados, também faz greve? E pior ainda, fá-lo por causa duma disputa com o governo e o primeiro-ministro, ie, com os restantes poderes?
Imaginemos o que seria se os outros poderes, se a Assembleia eleita, se o primeiro-ministro, agastado com a decisão que já foi dada como quase certa do tribunal Constitucional inviabilizar o referendo sobre o aborto antes de Outono do próximo ano, e discordante dessa interpretação, decidisse meter greve e acusar o Tribunal de intransigencia. E imaginemos que logo a seguir, o Presidente da República, com um governo e a assembleia em greve, sem nada para promulgar, e em protesto por tal situação metia também greve. Fechava-se no Palácio de Belém, ou seja, ficava em casa, e não recebia ninguém em audiência, nem conselheiros, nem acessores, nada. Ou então fazia greve logo quando saísse a decisão do Tribunal, porque sempre planeou acabar o mandato marcando o referendo, e agora só o sucessor é que o fará. Seria tão caricato e escandaloso que nem para República das Bananas valeriamos.
E nós, meros cidadãos, que faríamos? Eu por mim entrava em greve.

1 Comments:

Blogger ana said...

:D

eu gostei especialmente de "não perceber" porque é que eles estão de facto em greve num debate "prós e contras" de há umas 3 semanas. a sensação que me passou é que de facto estão a ser dados mais poderes aos juizes, o que dignifica a profissão deles, mas que de facto lhes estão a ser tirados previlégios.

10/25/2005 6:19 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home