segunda-feira, janeiro 16, 2006

O 25 de Abril na campanha: pequeno desabafo

Algum dia tinha de acontecer. Com uma carrada de candidatos "de Abril" contra um candidato "do não-Abril", só espanta aliás é que tenha sido necessário esperar por sexta-feira passada para Alegre reclamar o exclusivismo da paternidade do 25 de Abril, depois de Ramalho Eanes também o ter, mais subtilmente, feito. Felizmente no domingo mostrou-se mais sereno e parece ter emendado a mão. É necessário que duma vez por todas Portugal se decida sobre o que foi e é o 25 de Abril, e para que é que ele serviu. Quase 32 anos depois, continuamos a julgar alguém por "onde é que estava no 25 de Abril de 74", como se sé os que estavam num certo sítio que eles próprios delimitaram é que tivessem legitimidade para responder, proteger e gozar da democracia e da liberdade de expressão. Ou não foram essas as conquistas do 25 de Abril? E ao contrário do que alguns pensam, ainda o digo enquanto pessoa que se tiver de definir como de esquerda ou de direita, escolho a primeira.

sexta-feira, janeiro 06, 2006

As pilhas do Mundo

No princípio era cada um por si. Depois alguns começaram a associar-se em grupos e clãs. Mais tarde apareceu o Homo sapiens e surgiram cidades e países. Entretanto, as cidades e países mais poderosos conquistaram os mais pequenos e chamaram-se impérios. Finalmente, veio a ideologia da auto-determinação, e o mundo tornou-se um lugar melhor e mais bonito.
Ou não?
A verdade é que é muito bonito falar de independência e desígnios nacionais, mas o mundo tem um defeito de fabrico: não é homogéneo. Por alguma razão obscura (mas não são imperscrutáveis os desígnios divinos?), parece que há regiões de clima e recursos abençoados, e outras que no plano inicial deviam servir para albergar os desgraçados da família Caim. Como nunca parámos de fazer filhos, até os honestos Abéis (não confundir com guradas Abéis) tiveram de se espalhar por todo o lado. Eis-nos então chegados à nossa triste situação: condenados a importar gás natural da Argélia e petróleo do Médio Oriente. Como é que se pode então falar de independência se dezenas e dezenas de países no mundo não são viáveis sem os recursos energéticos que outrem, muito piamente, lhes vende? No mundo moderno, falar de independência política per se é um simpático romantismo, mas a questão vital é a da independência energética. E nisso, nós em Portugal, somos muito pouco independentes. Temos uns empreendimentozitos hídricos e eólicos, mas se não fosse o gás natural para acender o fogão e o petróleo para queimar em Sines e atestar o depósito, bem podíamos ir à lenha e atrelar os bois.
Claro que ninguém é parvo, e as nações há muito tempo repararam nisso, especialmente aquelas que são mais desenvolvidas e simultaneamente mais dependentes, ie, a Europa Ocidental. E se o público que anda de metro e toma banho todos os dias de manhã, nunca tinha parado para pensar nisso, pelo menos para lá dos Pirinéus, na Europa desenvolvida digamos, devem ter finalmente parado para pensar nisso esta semana, quando se descobriu que devido à guerra do gás entre a Gazprom (leia-se Kremlin) e a Ucrânia (leia-se Revolução Laranja), a pressão no gasoduto que leva o gás natural da longíqua Rússia para a Europa Central diminui consideravelmente. Ou seja, havia menos gás a circular. Nós por cá, confortavelmente sentados no topo do nosso negócio de gás com a Argélia, esse estável e respeitável estado do Magreb, nem reparámos.
De há uns anos a esta parte, a Europa tem então investido um pouco nas energias renováveis, mais nalguns países que noutros (que nisto do vento e do Sol passa-se o mesmo que com o gás, o petróleo e os boys, a distribuição é anisotrópica). Na Dinamarca, por exemplo, quase metade da energia eléctrica consumida é obtida em geradores eólicos no Mar do Norte. Por cá, é o que se sabe.
O que importa dizer no entanto, é que, mesmo que se cubram todos os telhados com células fotovoltaicas e todos os cabeços sem ermidas com geradores eólicos, dificilmente deixaremos de depender de alguém, para além de que ninguém está disposto a esse investimento, especialmente no que à energia solar diz respeito...
É, pois, minha convicção que a Europa e Portugal têm que pensar seriamente numa certa opção, mesmo que essa não seja a única (e não digo que deva ser, acho muito bem que se invista e se procurem novas e melhor soluções a nível de energias alternativas, de preferência articuladas com a indústria): o nuclear!

Requiam pela Palestina

Por estes dias assistimos à maior orgia mediática sobre o estado de saúde duma pessoa desde a morte de João Paulo II há quase um ano. É Ariel Sharon, o polémico general, político e primeiro-ministro israelita que, depois dum "ligeiro AVC", expressão popularizada pelo Eliseu há uns meses, teve agora um "grave AVC" e encontra-se em estado bastante crítico, senão mesmo às portas da morte. Parece que só um milagre é que o fará voltar à política activa, e disputar as eleições gerais de Março com o seu novo partido centrista, o Kadima. Embora ainda esteja tudo muito a fresco, e uma sondagem indique inclusive que o Kadima ganhará mesmo sem Sharon, custa a crer que nada mude nos próximos dois meses. Quem o sabe e tem a benificiar mais com a ausência do carismático primeiro-ministro, na minha opinião pessoal a personalidade do ano em 2005 e o mais importante líder de Israel desde Rabin, ou mesmo desde Ben-Gurion, são obviamente Netanyahu, e o Hamas e demais radicais palestinianos. Nenhum deles, especialmente os últimos, deseja uma evolução positiva do conflito e uma solução para a Palestina. Numa ironia da História, com a degradação da condição clínica de Sharon, o "carniceiro de Chatila", é também a possibilidade dum futuro menos sombrio para a Palestina a médio prazo que parece expirar também, a cada informação duma nova hemorragia cerebral do primeiro-ministro, e a cada reacção de euforia do presidente do Irão a essas notícias.